Friday, June 24, 2005

Após breve interacção com várias pessoas de meia idade, ao longo de conversas em jantares ou discussões pelo serão adentro, apercebi-me da presença de uma forte tendência, em algumas das pessoas em questão, para dirigirem estas conversas para o tema de doenças pessoais ou de outrém, bem como de desgraças sortidas (para fins de brevidade, vou passar a referir-me aos termos "doenças e desgraças" pela sigla "d/d"). Como d/d estou a referir-me, por exemplo, ao fantasma da pedra no rim, hemorróidas, ou às tão populares alergias/rinites/dores musculares, bem como a acidentes naturais que se nos atravessam à frente, como acidentes de viação.

Pude constatar que nestas conversas, estas d/d eram frequentemente associadas ao envelhecimento da pessoa que delas padecia, reconhecendo-se um relacionamento directo entre estes dois factores - quanto maior a idade de uma pessoa, maior o número de d/d que a atingem. À medida que aumenta o número percepcionado de d/d de que uma pessoa padece, maior é a convicção de que esta pessoa "está velha" e a "entrar na terceira idade", portanto, "que a morte está próxima".

Admitidamente, este é um lauto tema de conversa, possibilitando horas a fio de descrições pormenorizadas de episódios de incidentes, sintomas, dramas pessoais e tratamentos, bem como comparações com piores desgraças experienciadas pela pessoa que está a ouvir e tem de atirar qualquer coisa de volta para não ficar por baixo, quiçá rotulada como alguém que não sabe o que é sofrer. Quando existe o potencial de troca de histórias de d/d entre os intervenientes, qual a mais lancinante e patética, cria-se uma espécie de jogo (já caricaturado pelo grupo "Gato Fedorento" et. al.), em que entusiasmadamente se atiram histórias mais e mais deprimentes de um lado para o outro, numa interacção verbal que, embora nunca abandonando o espectro da desgraça, permanece viva e animada.

Enquanto eu reconheço a característica salutar de conversas como forma de fortalecer laços entre os comunicantes (ocorrendo este fortalecimento de forma subconsciente e não só), devo aqui alertar para importantes factores secundários advindos da utilização do tema "d/d" em conversas:

1. Para aqueles que não são velhos (física e/ou psicologicamente), este tema de conversa causa uma cisão (ou ruptura, como preferirem) entre este grupo e os activistas de d/d como tema de conversa. Isto sucede principalmente por este tema estar centrado em torno da depressão e do "coitadinhismo", hoje e sempre presente em múltiplos indivíduos da nossa sociedade. Desta forma, a companhia de elementos de um conjunto não será apreciada pelos elementos do outro, e vice-versa. Temos aqui portanto, um factor gerador de aumento do fosso entre gerações. Um factor secundário é também causar sono no outro grupo.

2. A concentração em d/d por parte de uma pessoa atrai, por sua vez, posteriores d/d. Isto é um facto comprovado pelas principais ciências e religiões. Como exemplo, de um ponto de vista da medicina oriental, o foco em assuntos que como este, possuem associadas a si energias negativas, atrairá ao indivíduo futuras energias negativas. Estas energias negativas, bem reais na medicina oriental (e ainda em fase de aceitação pela ocidental) são as causas de doenças físicas e espirituais, bem como atractoras de má-sorte, provocando acidentes como tropeçar ao caminhar ou ir contra portas de vidro fechadas.

3. A discussão de d/d acelera o envelhecimento físico, através da auto-indução no indivíduo de envelhecimento psicológico. Ou seja, a pessoa convence-se de que "está velha", e isto envelhece-a.

Em suma, procurei assinalar aqui uma das principais causas dos males neste mundo. Pretendo que se passe a evitar este assunto, cada um absorvendo-o para dentro de si como se tivesse engolido uma batata frita sem mastigar? Não. O que eu pretendo é alertar para as consequências prejudiciais advindas de uma utilização excessiva deste assunto, e pedindo que as pessoas encontrem um equilíbrio entre temas de conversa por que optam, e que tenham piedade daquelas que não estão à "beira da morte" (psicologicamente) como elas, ou que se convençam que isso não é de todo verdade.



P.S.: apercebi-me na redacção deste texto que "conversa" mal escrito dá "conserva". O mundo nunca pára de me surpreender com estas pequenas coisas...

Friday, June 17, 2005

Recentemente nas minhas navegações, deparei-me com um crítico de cinema com gostos e opiniões parecidas com as minhas, e que até já vem com sentido de humor! É daqueles que diz mal de (quase) tudo o que é filme (principalmente hollywoodescos, mas também casca em algumas tretas supostamente intelectuais e "artísticas" europeias), mas este ao menos ainda apresenta razões decentes, e destaca exemplos do que é bom. Para terem uma ideia, é uma espécie de Mário Augusto cruzado com "O Meu Pipi" (é mais Pipi e só ligeiramente arraçado de Mário Augusto...)

http://cinemaxunga.blogspot.com/

Cito aqui uma transcrição da crítica ao Oceans Twelve (com a qual apenas concordo parcialmente, visto ter gostado bastante do filme):

"Sinopse:Um grupo de estilistas, em conjunto com duas agências de viagens, resolvem promover uma sequela de um filme de sucesso. Chamam Brad Pitt, Clooney, Zeta-Jones, Julia Roberts, Andy Garcia, Matt Damon, etc e dizem-lhes: "Andem aí de um lado para o outro a espalhar charme e a dizer nonsense que a gente depois edita isto como puder e faz um filme".

Crítica: Hollywood é campeã do mundo da reciclagem, ou seja, remexem constantemente o lixo para no fabricar novos produtos. Tal como nos outros casos, o símbolo de "reciclado" ajuda a vender. "Não foram usados cérebros verdadeiros na feitura deste guião!", é o que no diz o cartaz... Desta vezes temos algo tão bizarro como a sequela de um remake. E que história é esta de sequela de remake? Bem, significa basicamente "fazer render o peixe". Mais ou menos como aquele sketch do kunami do Gato Fedorento: "Oh amigo, mas isto é merda seca? Não, não... É Ocean's Twelve!"(...)" E por aí afora.

Vale pelas risotas e para descobrir algumas pérolas escondidas que vos tenham escapado (bem como para poupar tempo precioso evitando filmes merdosos que, incautos, resolvessem ver com intenções de entretenimento...)
Pois é, hoje peguei em mim e fui ver o Mr. & Mrs. Smith ao Avenida, em estreia em várias salas perto de si. Entretém, mas não é nada de especial: quem gosta de ver Brad Pitt, Angelina Jolie, discussões conjugais tratadas de forma cómica, e os referidos actores aos tiros com armas automáticas de elevados calibres, pode gostar. Porém, acho que o filme é um caso do "todo que não é maior do que a soma das partes", porque tinha muitos ingredientes para encher mas não chega lá. Como não sou crítico de cinema, não me vou estender mais.

Gostaria só de comentar certos pormenores, agora completamente á parte: este é claramente um filme de grande perfil, existindo a tendência para encher salas. Ainda mais, nos dias de estreia.
No entanto, qual não é o meu espanto quando noto que em noite de estreia, no Avenida (Coimbra), a sala estava apenas a cerca de um quarto da lotação... será que o pessoal migrou todo para o Dolce Vita (centro comercial com muitas lojas e muitas escadas rolantes), onde o filme estava também a estrear? Será que intermináveis lojas de roupa, andar a brincar aos carrinhos de choque mas com pessoas, e imensas opções de restaurantes de junk-food onde se pode afundar mais uns minutos de vida num prato desviaram o povo de uma boa sala de cinema? Ou talvez será o aspecto algo decadente da sala em si... cadeiras com estofos rotos, algumas destruídas, paredes escurecidas... Eu viro-me mais para o poder hipnótico do buraco-negro de gente que é o Dolce Vita (qual será o interesse, ponderemos em silêncio...)

Outra coisita: sempre que o Brad Pitt mexia um músculo no filme, piscava um olho ou tinha um espasmo, o público feminino na sala suspirava, ria, ou comentava. Este comportamento é claramente anormal. Exijo um estudo científico para descobrir a causa.

Pronto, já tá tudo. Para o ano pode ser que faça mais um post, que isto hoje foi a loucura completa e fiquei exausto. Até lá... evitem o Dolce Vita.